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A Crise Climática e Violência contra Crianças: Uma Realidade Alarmante

  • Juliana Nogueira
  • 25 de mar. de 2023
  • 3 min de leitura



Não é só o Brasil que sofre com aumento dos índices de violência contra crianças relacionado à crise do clima. Os impactos das mudanças climáticas estão aumentando os riscos de diferentes formas de violência contra crianças em todo o mundo, colocando em risco conquistas importantes na proteção da infância. Relatórios recentes mostram que, após desastres naturais e crises humanitárias — como deslocamentos forçados, escassez de alimentos e conflitos — aumentam os casos de trabalho infantil, casamento precoce, mutilação genital feminina, violência doméstica e de gênero, além de traumas emocionais profundos.


Esses efeitos são especialmente graves quando atingem crianças na primeira infância, uma fase determinante para o desenvolvimento físico, emocional e social. Experiências negativas nesse período deixam marcas duradouras, prejudicam a resiliência infantil e comprometem a capacidade das crianças de se adaptarem às mudanças futuras, minando investimentos em sua saúde, educação, segurança e bem-estar.


A violência sexual, doméstica e familiar tende a crescer em cenários de vulnerabilidade extrema, como quando famílias perdem tudo e são forçadas a viver em abrigos temporários. Adolescentes relatam altos níveis de assédio e abuso sexual nesses locais, devido à superlotação, falta de privacidade, iluminação e instalações seguras para mulheres e meninas. Nessas condições, as famílias muitas vezes tomam decisões desesperadas, como tirar os filhos da escola para que trabalhem ou forçá-los a casamentos precoces.


No Caribe, entre 2014 e 2018, 3,4 milhões de pessoas — incluindo mais de 760 mil crianças — se deslocaram internamente devido à ciclones tropicais. Esse número foi mais de seis vezes maior que o registrado nos cinco anos anteriores. Estudos mostram que meninas nessas situações enfrentam maiores riscos de abandono escolar, tráfico humano, casamentos forçados, exploração sexual e abuso.


Em Bangladesh, um país altamente vulnerável aos impactos climáticos e com altos índices de pobreza e casamento infantil, os choques ambientais agravam essa realidade. Famílias pressionadas pela escassez frequentemente casam suas filhas mais cedo, muitas vezes aceitando propostas desfavoráveis. O casamento infantil, nesse contexto, é visto como uma forma de "garantir" o futuro de meninas que os pais não conseguem alimentar, educar ou proteger. Essa prática é reforçada por normas culturais desiguais e se intensifica à medida que o clima enfraquece os sistemas de apoio social, os serviços públicos e os mecanismos de proteção.


O trabalho infantil também cresce em situações de desastre. Em 2017, no distrito de Rautahat, no Nepal, inundações e deslizamentos afetaram 1,7 milhão de pessoas. Durante a recuperação, foi observado um aumento expressivo no número de crianças trabalhando, especialmente em fornos de tijolos e na agricultura. Algumas crianças chegaram a assumir dívidas em troca de trabalho, ficando presas em situações de trabalho forçado por não conseguirem quitar os empréstimos.


A UNICEF alerta para o aumento do casamento infantil no contexto da seca e da crise alimentar no leste da África. Meninas de apenas 12 anos têm sido casadas com homens mais velhos, em troca de dotes que ajudam a sustentar o restante da família. Essa prática também é vista como uma forma de "reduzir o número de bocas para alimentar" ou de garantir que a menina tenha um lar minimamente estruturado. Estimativas indicam que o número de casamentos infantis dobrou nas regiões mais afetadas, acompanhados de um aumento de 27% nos casos de mutilação genital feminina — frequentemente exigida como condição para o casamento. Além disso, a crise afastou profissionais e voluntários que atuavam na prevenção dessas práticas, enfraquecendo ainda mais a rede de proteção infantil.


Diante desse cenário, é urgente adotar uma abordagem multissetorial coordenada para enfrentar, de forma integrada, os efeitos da crise climática e da violência contra crianças, sobretudo na primeira infância — fase em que os seres humanos estão mais vulneráveis e mais dependentes de proteção e cuidado.


As mudanças climáticas não são apenas uma ameaça ambiental — são uma crise humanitária, social e moral que expõe milhões de crianças a situações de risco extremo. A relação entre eventos climáticos extremos e o aumento da violência contra crianças evidencia a necessidade de políticas públicas que aliem proteção ambiental, justiça social e garantia dos direitos da infância. Investir em medidas de prevenção e resposta coordenadas, com foco especial nas populações mais vulneráveis, é essencial para proteger meninas e meninos dos efeitos devastadores da desigualdade e da emergência climática. Cuidar da infância é cuidar do presente e do futuro — e isso exige ação urgente, integrada e comprometida.


 


 
 
 

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